“Aquela que esteve tão intimamente associada ao mistério da salvação humana está igualmente associada à distribuição das graças que, por todos os tempos, fluirão da Redenção.” Papa Leão XIII, encíclica Adjutricem Populi, 1895.

Hoje, 27 de novembro, a Igreja comemora o dia da “Medalha Milagrosa”, pois em 1894 o Papa Leão XIII concedeu a todas as dioceses da França celebrar o aniversário das aparições de Nossa Senhora à Santa Catarina Labouré, ocorridas em 1830 [1]. Posteriormente, essa memória facultativa, bem como a devoção, foram espalhadas por todo o mundo católico pelos vicentinos, como desejado pela Providência.

A Medalha Milagrosa, como ficou popularmente conhecida por suas inúmeras graças, conversões e milagres concedidos desde então instituída, foi cunhada a pedido de Nossa Senhora, após suas aparições na capela da Rue do Bac, 140, em Paris, França, à reservada e humilde noviça da ordem das Filhas da Caridade, Catarina Labouré. Esse precioso trabalho se deu sob orientação do confessor da vidente, que só acreditou nela após o profético destronamento do rei da França, no vigente período histórico. Após aprovação e motivação do arcebispo de Paris, a medalhinha foi confeccionada em maior quantidade e, gradativamente, distribuída a partir de 1832, por conta de uma epidemia de cólera que dizimava a região.

Mas o que é representado na Medalha Milagrosa? Foi o que a santa vidente viu na principal das 3 aparições, ocorrida em 27/11/1830: sob aspecto de um “quadro vivo”, na frente da medalha, a Virgem Maria, como Nossa Senhora da Conceição, com raios descendo de suas mãos [2], representando as graças que pedimos e que devemos pedir, pisando a serpente (o Demônio) tal qual se lê em Gênesis 3,15, sob a semi-esfera. E, em círculo oval envolvendo o quadro, a oração: “Oh Maria concebida sem pecado, rogai por nós, que recorremos a vós“. [3]
Nesse momento da aparição, tais foram as palavras da Virgem a Santa Catarina: “Estes raios são o símbolo das graças que concedo àqueles que Me pedem”.
Vejamos bem: eis a imagem de Nossa Senhora das Graças. É inevitável, perante esta gravura, não recordar da doutrina atestada pelos santos padres e doutores de que devemos pedir à Virgem Santíssima que nos alcance de seu Filho todas as graças necessárias. Ela não é a fonte, mas o canal que transborda de graças dadas por seu divino Filho.
No verso da medalha (do “quadro vivo”, oval na aparição), vemos um grande “M” encimado por uma Cruz. Logo abaixo, o Sacratíssimo Coração de Jesus (tal qual revelado a Santa Margarida Maria Alacoque séculos antes, com a chama da Caridade divina e rodeado por espinhos) e, ao Seu lado, o Imaculado Coração da Virgem Maria, transpassado pela espada. E, rodeando este verso da medalha, as 12 estrelas, que significam os 12 apóstolos, ou seja, toda a Igreja; é símbolo também da coroa da Mulher do Apocalipse (Ap 12,1), que derrota o dragão infernal.
Ora, caríssimos leitores, eis um dos fundamentos da doutrina católica sobre a Corredenção de Nossa Senhora, ilustrados na medalha: quem mais colaborou com Nosso Senhor em seu ato salvífico no Calvário senão aquela que esteve aos pés da Cruz, sofrendo na alma as dores do Filho? Como profetizou o velho Simeão: “quanto a ti, uma espada te transpassará a alma” (S. Lucas 2,35).
Recentemente, no início de novembro, todo o orbe católico se viu perplexo com a nota doutrinal (Mater Populi Fidelis) do cardeal Victor Fernandéz, desaconselhando que se usassem os títulos “Corredentora” e “Medianeira de todas as Graças”, por motivos ecumênicos. Na opinião do cardeal, contrariando, infelizmente, a boa teologia, vários escritos e declarações do magistério ordinário da Igreja, não estaria clara a doutrina da cooperação de Maria Santíssima no ato salvífico de Cristo. Será que o cardeal ignorou também a Medalha Milagrosa?
Para concluir, podemos afirmar que a doutrina da corredenção de Maria Santíssima, que foi posta nos escritos dos Padres da Igreja, papas e doutos teólogos [4], foi facilmente compreendida e aceita pelo povo fiel (pelo Sensus fidei): que a Virgem Santíssima cooperou de maneira singular na obra da Redenção e por isso mereceu o título de Corredentora, sempre condicionado à mediação redentora de Cristo na Cruz. Ela atuou, portanto, como quem auxilia na Redenção conquistada pelo sangue de seu Filho. Afinal, se nós somos convidados a unir nossos sofrimentos à Paixão de Cristo, como ensina São Paulo (Col 1,24), para o bem da Igreja, quanto mais meritório e colaborativo foi o ato de colaboração da Imaculada Virgem Maria aos pés da Cruz. E a afamada Medalha Milagora, como que um presente celeste dado para toda a Igreja em 1830, nos recorda este ensinamento simbolicamente desenhado.
Notas e Referências:
[1] – Algumas fontes sobre as aparições pelos links:
https://www.chapellenotredamedelamedaillemiraculeuse.com/langues/portugues/as-aparicoes-a-medalha/;
https://padrepauloricardo.org/episodios/nossa-senhora-das-gracas-e-a-medalha-milagrosa;
https://diocesedesetelagoas.com.br/festa-de-nossa-senhora-das-gracas/; e
https://www.youtube.com/watch?v=_beE-GyCQjE (vídeo assistido em 25/11/2025):
[2] – Na visão original, está a Virgem Maria segurando um globo encimado por uma cruz em suas mãos. Nos seus dedos anéis com pedras preciosas onde de alguns saíam raios mais luminosos e outros apagados. Seriam as graças dadas e, de outros não luminosos, as graças ainda não pedidas. “Este globo representa o mundo inteiro, a França e cada pessoa em particular”, nas palavras da Virgem. Por orientação do confessor da Vidente, fora cunhado a imagem a certo modo não completa/distinta, mas com consentimento da Virgem Santíssima, segundo o relato de Santa Catarina Labouré.
[3] – Esta oração foi revelada na Medalha Milagrosa, pois não era conhecida na época e corroborou para a proclamação do Dogma da Imaculada Conceição em 1854 pelo Papa Pio IX.
[4] – Conferir algumas citações no artigo de Dom Athanasius Schneider sobre os títulos de Corredentora e Medianeira de todas as Graças, disponível em https://ssvm.org.br/artigo4/dom-athanasius-schneider-sobre-os-titulos-de-co-redentora-e-medianeira-de-todas-as-gracas/