Jesus todo inteiro pertence a Maria, mas há algo em Jesus que é mais especialmente de sua Mãe: seu Coração.
O que São Francisco de Assis, Santa Gertrudes ou Santa Margarida Maria conheceram desse Coração adorável, é apenas um átomo do sol radiante que foi o conhecimento íntimo com que a Virgem Maria penetrou nesse abismo de amor e de misericórdia.
Daí a semelhança prodigiosa, muito mais ainda que no físico, no moral, entre o Coração de Jesus e o de Maria. Porque, se na fisionomia de Jesus estavam seguramente muito marcados os traços de rara formosura da Virgem, que diremos das outras semelhanças, as dessas duas almas e dos seus sentimentos interiores? A este Filho-Deus, esta Mãe única!
Por isso os dois títulos que para nós têm um significado e importância e sabor especialíssimos: “Mãe do Belo Amor” e “Mãe de Misericórdia” (Ladainha).
Mãe d’Aquele que é o Amor dos amores, d’Aquele que se define como Caridade e Amor. E foi Ele mesmo quem criou à sua imagem e semelhança a sua própria Mãe, a mais amante e amorosa de todas as criaturas, por ser a que mais perfeitamente reproduz em seu Coração Imaculado o atributo por excelência do Senhor: a Caridade.
Toda a grandeza, toda a formosura, todo o poder e toda a fecundidade desta Filha e Mãe do Rei está no seu amor. E por isso Deus colocou n’Ela todas as suas complacências e depositou em seu Coração todos os seus tesouros, porque como nenhum outro ser criado, nenhum serafim ou santo, dilexit multum, “amou muito” (Lc 7, 47).
Devia ser Imaculada por ser Mãe d’Aquele que é a Santidade substancial, e também porque devia amar com capacidade de amor que nenhum coração manchado pôde jamais ter ao dar-se a Deus. Amou, portanto, com plenitude de amor, porque pôde amar e amou com um Coração Imaculado.
Amou como criatura, a única perfeita, com amor perfeito; amou como Esposa, a eleita entre milhares, e como Virgem cuja integridade, realçada pelo milagre da fecundidade divina, centuplicara em Maria a potência de amor pelo seu Criador, convertido em Esposo divino e em Filho seu. Maria amou a Deus como Mãe, pois que o Verbo foi na realidade seu Filho, envolto nos panos da carne mortal. Que de incêndios não comunicaria o Filho, à Mãe, pagando seus desvelos, seus beijos e ternuras com chamas de caridade abrasadora, infinita!
Daí seguiu-se para esse Coração virginal e materno, feito brasa viva de amor divino, aquela suavidade e doçura, piedade e misericórdia da Rainha: Mater misericordiae.
Chega o Senhor à terra, trazendo-nos na forma encantadora de Irmão nosso a benignidade do Pai celestial, o seu perdão.
Mas chegou até nós nos braços de uma criatura incomparável, mulher como nossas mães, mil vezes mais terna ainda que todas elas. Do berço do seu regaço, apoiado no Coração da Rainha, sorriu à terra, olhou-a com piedade infinita. Dos seus braços maternais, Jesus deu a primeira bênção ao mundo culpado, chorando já, nesse altar que era Maria, e oferecendo-se nele ao Pai, como Salvador de infinita misericórdia.
Ah! Como a Hóstia de misericórdia, Jesus, assim também trono e ara de misericórdia, Maria!
Quem jamais reproduziu como a Virgem a infinita compaixão do Coração de Jesus? Quem jamais melhor que Ela pregou e prodigalizou toda a doutrina do Amor misericordioso de Deus, encarnado não para julgar, mas para salvar?
Como deve ter dilacerado o Coração de Maria o grito de pânico e de gelo lançado pelo jansenismo! Como deve ter protestado com lágrimas de sangue, em união com a Igreja católica, quando se esforçavam por fechar a ferida do Lado, ou ao menos ocultá-la à caravana de almas débeis e pecadoras que a buscavam com afã, para asilo e farol, manancial e porto!
Ela, que sabia por que chorava o Menino, ainda tão pequeno, nos seus braços ; Ela que sabia o motivo pelo qual sofreu o desterro do Egito; Ela, que sabia o porquê misterioso daqueles trinta anos de solidão, de humilhações e silêncio em Nazaré; Ela que, como ninguém, sabia o último porquê do prodígio de amor da Quinta-Feira Santa e de todas as ignomínias e dores da Sexta-Feira Santa; Ela que recebeu o Coração do Salvador e o da Igreja, ambos arcas de salvação e não tribunais de condenação . . . Ah ! como deve ter desviado os olhos e fechado os seus ouvidos quando algum filho degenerado, de sobrolhos carregados, gesto inclemente e palavras destituídas de misericórdia, desfigurou ao seu Jesus!
Bebei, apóstolos do Divino Coração, bebei a sorvos largos, no Coração de Maria, a doutrina suave e forte do amor, a doutrina sólida, autêntica e tão consoladora da misericórdia. Aprendei na escola de Maria que ser bom com as almas, ser compassivo, ser misericordioso não é – oh!, não! – nenhuma debilidade, nenhuma condescendência ridícula e indevida, mas o mais substancial, o mais forte e puro da farinha com a qual se engendra e forma a Jesus nas almas.
Em vossos momentos de filial intimidade com a Mãe do Belo Amor, suplicai-lhe que infunda em vós, como fez a S. João Eudes, o verdadeiro espírito do amor e do apostolado do Coração de Jesus, aquele espírito que não se aprende nem se adquire em toda a sua pureza senão nessa escola do Puríssimo Coração de Maria.
Por isso encontrareis sempre nos grandes servidores da Rainha, como São Grignon de Monfort e o S. Antônio Claret, aliada à santa intransigência de princípios, aquela unção, aquela ternura apostólica, aquela imensa compaixão e indulgência que aprenderam, sem dúvida, dos lábios de Maria.
Por isso comoveram o mundo das almas, por isso foram os mensageiros vitoriosos do Evangelho e os renovadores providenciais, na sua época, do verdadeiro espírito cristão. Daí também a sua estupefaciente fecundidade e o motivo por que as obras redentoras fundadas por tais filhos mimados de Maria perduram e florescem com tanta louçania.
Referência bibliográfica:
CRAWLEI-BOEVEY, Padre Mateo. Jesus, Rei do Amor. Rio de Janeiro – RJ: Vozes, 1956, p. 282-285.