A Conformidade Com a Vontade de Deus

No dia dedicado pela Igreja à memória de S. Afonso de Ligório, iniciamos, com gáudio, uma série de artigos que perfazem uma de suas magníficas obras.
Tempo Estimado de Leitura: 6 minutos

A Conformidade Com a Vontade de Deus

No dia dedicado pela Igreja à memória de S. Afonso de Ligório, iniciamos, com gáudio, uma série de artigos que perfazem uma de suas magníficas obras.
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Toda a nossa perfeição consiste em amar ao nosso amabilíssimo Deus. A caridade é o vínculo da perfeição. (Cl 3, 14). E toda a perfeição do amor de Deus consiste em unir a nossa vontade com a sua santíssima vontade. O principal efeito do amor, diz S. Dionísio (De Div. Nom. C. 4), é unir a vontade daqueles que se amam de maneira que se torne uma e a mesma vontade. Por conseguinte, quanto mais uma pessoa está unida com a vontade divina, maior será o seu amor. Penitências, meditações, comunhões e obras de caridade praticadas para com o nosso próximo são de certo agradáveis a Deus, mas quando essas obras são feitas em conformidade com a sua vontade; quando elas não são praticadas pela vontade de Deus, não só lhe são desagradáveis, mas odiosas e merecedoras unicamente de castigo. Se um amo tivesse dois criados, dos quais um trabalhando todo o dia, mas conforme a sua própria vontade, e o outro trabalhando à vontade de seu amo, seguramente o amo estimaria mais o segundo do que o primeiro. Como podem nossas ações promover a glória de Deus, se não forem conformes ao seu divino agrado? O Senhor, disse o profeta a Saul, não deseja sacrifícios, mas obediência à sua vontade: acaso pede o Senhor holocaustos e vítimas, e não obediência à sua voz? (I Rs 15, 22-23)

Aquele que trabalha segundo a sua própria vontade, e não conforme a vontade de Deus, comete uma espécie de idolatria, porque, em lugar de adorar a vontade divina, adora de alguma maneira a sua própria. A maior glória pois que nós podemos dar a Deus, é cumprir sua bendita vontade em tudo. O nosso Redentor, que baixou dos Céus à terra para promover a divina glória, cumprindo com a divina vontade, veio principalmente ensinar-nos a assim o praticarmos, pelo seu mesmo exemplo. Escutemo-lo, como S. Paulo no-lo descreve, falando ao seu Eterno Pai: Vós não tendes querido sacrifício nem oblação, porém haveis-me dado um corpo… Então eu disse, eis-me aqui ó Deus, para fazer a vossa vontade. (Hb 10, 5-9)

Vós tendes recusado as vítimas que os homens vos têm oferecido, e me ordenastes sacrificasse o corpo que me haveis dado, eis-me pronto a fazer a vossa vontade. E ele, repetidas vezes, declara que não veio fazer a sua vontade, mas sim a de seu Eterno Pai: Eu desci do Céu, não para fazer a minha vontade, mas sim para cumprir a daquele que me enviou. (Jo 6, 38). E nisto desejava Ele que o mundo conhecesse o amor que tinha a seu Pai, na sua obediência à sua vontade, a qual era que Ele fosse crucificado sobre uma cruz, para a salvação do gênero humano; por isso, quando o Senhor se adiantou a encontrar seus inimigos, no horto de Getsêmani, que vinham para o prender e matar, Ele disse: Eu me entrego ao seu furor, para que o mundo veja que eu amo a meu Pai e que cumpro o que meu Pai me tem ordenado. Levantai-vos pois e vamos daqui. (Jo 14, 31). E dessa maneira, cumprindo com a divina vontade, Ele disse que conhecia quem era seu irmão: Aquele que fizer a vontade de meu Pai, que está no Céu, esse é meu irmão. (Mt 12, 50)

Tem sido sempre este o fim que os santos todos têm levado em vista: a conformidade com a vontade de Deus. Conhecendo muito bem que nisto consistia a pureza da alma, o beato Henrique Suso disse: Deus não quer que nos abundemos em luzes espirituais, mas sim que em tudo nos conformemos com a sua divina vontade. E Santa Teresa: Tudo o que se deve procurar no exercício da oração é a conformidade da nossa vontade com a vontade divina, tendo por certo que nisto consiste a maior perfeição. Aquele que for superior nesta prática receberá maiores mercês de Deus e fará os maiores progressos no caminho da perfeição. A Beata Stephânia de Soncino, religiosa da Ordem de S. Domingos, sendo arrebatada em espírito e levada ao Céu em uma visão, viu algumas pessoas que conhecia, e que tinham morrido, colocadas entre os serafins, e lhe foi dito que tinham sido exaltadas a tão alto grau de glória, em consequência de sua conformidade com a vontade de Deus, enquanto estiveram sobre a terra: e o beato Suso, que acima mencionamos, falando de si mesmo, exclama: Eu antes queria ser o mais vil inseto que se arrasta pela terra, pela vontade de Deus, do que ser um serafim pela minha vontade. Nós devemos neste mundo aprender dos santos, que estão no Céu, a maneira de amar a Deus. O amor puro e perfeito que os bem-aventurados no Céu têm para com Deus consiste em uma perfeita união da sua à divina vontade. Se os serafins entendessem ser esta vontade que eles levantassem montes de areia sobre as praias do mar, por toda a eternidade, ou que arrancassem erva nos jardins, eles o fariam com o maior prazer e gosto. E mais ainda: se Deus lhes significasse que seriam queimados no fogo do inferno, eles desceriam imediatamente ao abismo, para cumprirem a vontade divina. E é o que Jesus Cristo nos ensina a pedir, que se faça a vontade de Deus na terra, como os santos a fazem no Céu (Mt 6, 10). Nosso Senhor chama a Davi um homem segundo o meu coração, porque cumpriu todas as minhas vontades. (At 13, 22)

Davi sempre estava pronto a abraçar a divina vontade, como ele mesmo declara: O meu coração está pronto, oh!, Meu Deus, o meu coração está pronto. (Sl 56, 8). E tudo quanto ele pedia ao Senhor era que lhe ensinasse a cumprir a sua divina vontade: Ensinai-me a fazer a Vossa Vontade. (Sl 142, 10)

Um ato de perfeita uniformidade com a vontade divina basta para constituir um santo. Veja-se São Paulo: no tempo em que era o perseguidor da Igreja, foi iluminado e convertido por Jesus Cristo. E depois, como procedeu? Que disse? Tudo quanto fez foi oferecer-se à divina vontade, dizendo: Senhor, que quereis vós que eu faça? (At 22, 10). E o Senhor lhe declarou que seria um “vaso de eleição” e o “Apóstolo dos gentios” (At 9, 15). Aquele que entrega a Deus a sua vontade entrega-lhe tudo. Quem dá seus bens em esmolas, seu corpo às disciplinas, e seu alimento ao jejum dá uma parte do que possui: mas aquele que entrega a Deus a sua vontade dá tudo e pode dizer: Senhor, eu sou pobre, mas eu vos dou tudo quanto possuo, dando-vos a minha vontade, e nada mais tenho que vos dar.

É isto só o que Deus espera de nós: “Filho”, diz Ele a cada um de nós, “dai-me o teu coração.” (Pv 23, 26). Isto é, a tua vontade; nós, diz Santo Agostinho, não podemos oferecer a Deus coisa que mais agradável lhe seja que dizer-lhe: Senhor, tomai posse de nós; nós vos entregamos a nossa vontade, fazei-nos saber o que exigis de nós, e nós o cumpriremos.

Se, pois, queremos dar um grande prazer a Deus, devemos conformar-nos com a sua divina vontade; mas não só conformar-nos, porém unirmo-nos aos seus mandados. Conformidade expressa a união da nossa com a vontade de Deus; mas uniformidade quer dizer mais, quer que a vontade divina e a nossa seja uma só, de maneira que não devemos desejar senão o que Deus deseja e quer. É esta a maior perfeição à qual devemos aspirar; este deve ser o objeto de todas as nossas ações, de todos os nossos desejos, meditações e orações. Para isso devemos pedir o socorro do nosso anjo da guarda e dos santos, nossos advogados, e sobretudo a proteção da Santíssima Mãe de Deus, a qual é a mais perfeita entre todos os santos, e porque foi quem mais perfeitamente abraçou a vontade divina em todas as ocasiões.


Nota:

1.    LIGÓRIO, S. Afonso Maria de. Tratado da Conformidade com a vontade de Deus. Niterói – RJ: Escola Salesiana, 1913, p. 1-9.

Maria Sempre!

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